Porque comunicamos ciência
“Não basta estar certo, é preciso comunicar eficientemente”.
Dita pelo pai do célebre astrofísico e comunicador Neil deGrasse Tyson, essa frase continua importante atualmente. Apesar de vivermos na maior taxa de educação superior formal e de acesso à informação da história humana, o negacionismo de conceitos básicos da ciência cresce – ou pelo menos se tornou mais evidente – nos últimos anos. Cientistas e profissionais com décadas de estudos e centenas de manuscritos publicados ainda lutam para informar o público das suas descobertas. Por outro lado, celebridades digitais e mensagens em massa nas redes sociais - muitas vezes sem qualquer referência - podem alterar o mercados e governos. Basta observar o estrago das fake news nas nossas políticas públicas (e relação familiares).
Mas afinal, como se comunica ciência? Mais importante ainda: o que é ciência?
A ciência é todo conhecimento adquirido através do método científico, baseado na formulação e teste sistemático de hipóteses. Todos os seres humanos (inclusive cientistas) possuem seus vieses de percepção e interpretação, que infelizmente são consequência de como nosso cérebro funciona. Dessa forma, usamos a coleta e análise sistemática de dados para tentar superar nossos vieses. O método científico é “Fazermos todo o possível para não nos enganarmos”, outra frase de Neil deGrasse Tyson.
Por muito tempo a ciência foi tradicionalmente comunicada através de livros, eventos científicos, aulas presenciais e artigos em revistas. Apesar de muitos destes meios tradicionais de divulgação terem se adaptado à explosão da internet a partir dos anos 2000 com, por exemplo, o formato digital hoje adotado pela maioria das revistas científicas, uma nova geração de cientistas comunicadores se popularizou. Por exemplo, a personalidade escolhida para falar sobre a atual pandemia em rede nacional no Roda Viva foi o doutor Atila Iamarino, não somente pelo seu sólido conhecimento no assunto, mas também por trazer o pensamento científico para os brasileiros neste período. Além de estar certo, Atila também sabe comunicar eficientemente.
Cobra-se cada vez mais que nossos estudantes e cientistas publiquem artigos científicos em qualidade e quantidade. Pessoas e instituições muitas vezes são elencadas por suas publicações, mas poucas instituições oferecem treinamento para a redação destes materiais. Estas instituições estão ainda menos preparadas para capacitar os cientistas nos novos meios de comunicação digitais mencionados anteriormente. Este cenário já apresenta sinais de mudança, com alguns editais de projetos exigindo um plano de comunicação científica como critério de financiamento. Aos poucos a academia parece reconhecer a importância da comunicação do conhecimento para além dos especialistas.
Comunicar e registrar nosso conhecimento hoje permite que ele sobreviva além de nós. Quando trabalhei com plantas trepadeiras durante meu mestrado, consultei um livro de Charles Darwin de 1865 para ver o que ele tinha a dizer sobre elas. De noite, li um poema de Fernando Pessoa de 1946, que se tornou a epígrafe da minha dissertação. Isso só foi possível porque eles registraram suas percepções do mundo. Registrar nosso conhecimento, seja através de um artigo científico, um vídeo no Youtube, um poema, uma música, ou um blog, protege a informação contra a passagem do tempo, lançando-a para o futuro. Na comunicação científica, isso significa que os que virão depois de nós continuarão de onde paramos, não repetirão nossos erros e, se tudo der certo, construirão uma sociedade mais sustentável. Mas isso só será possível se soubermos comunicar bem o conhecimento de hoje.
*Bio: Ricardo Gomes César é engenheiro florestal com doutorado em conservação de ecossistemas pela Universidade de São Paulo, no qual desenvolveu e colaborou em diversos artigos científicos publicados em revistas internacionais. Coordenou projetos de restauração de paisagens florestais, onde envolveu-se com diferentes atores para a restauração florestal. Atualmente é aluno de pós-doutorado do NewFor. YouTube Linkedin Lattes ResearchGate
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**O texto acima é um artigo de opinião, e não representa a opinião de todos os membros do NewFor ou de seus órgãos financiadores.
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