Justiça climática em Piracicaba: participação para superar a crise do clima
O Imaflora (Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola) é uma organização brasileira, sem fins lucrativos, que trabalha desde 1995 para promover transformações nos setores florestal e agropecuário.
O Instituto acredita que, estimulando boas práticas de produção, é possível promover a conservação e o uso sustentável dos recursos naturais e gerar benefícios sociais.
A entrevista de hoje é com Nara Perobelli, consultora contratada pelo Imaflora para coordenar o projeto Pira no Clima, que está construindo um plano participativo de adaptação e mitigação climática para o município de Piracicaba/SP.
Nara Perobelli é gestora ambiental pela ESALQ/USP e trabalha com a temática de gênero e clima de maneira interseccional no Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora) e Observatório do Clima (OC).
O que é o projeto, como e de onde surgiu a sua necessidade?
Nara: O “Pira no Clima” é a construção participativa de um Plano Municipal de Adaptação e Mitigação Climática para o município de Piracicaba que leve em consideração questões de gênero de maneira interseccional, ao mesmo tempo em que gera e difunde dados sobre o município.
O conceito de adaptação propõe que o município e as pessoas se adaptem à mudança climática, que já é uma realidade, e a mitigação tem como intenção reduzir significativamente ou zerar a emissão de gases de efeito estufa.
Para nós, esse projeto tem muitas razões de ser, vou trazer duas delas na minha fala. Primeiramente, Piracicaba é a cidade natal do Imaflora e é onde temos nossa sede. Desde 2012 trabalhamos com políticas públicas em conjunto ao Observatório Cidadão de Piracicaba e, a nível nacional, somos responsáveis pelos cálculos das emissões de gases de efeito estufa do Brasil no setor agropecuário, elaborando propostas para a redução dessas emissões com o Observatório do Clima. Convergir nossas atuações em políticas públicas e clima em Piracicaba faz parte do nosso planejamento estratégico e já era um desejo antigo.
Em segundo lugar, não poderia deixar de citar o famoso jargão ecológico “pensar global, agir local”. Sabemos que os municípios têm grande responsabilidade em termos de adaptação e mitigação, porque é justamente neles que a vida “acontece” através de acesso à saúde, interação com natureza, escolhas alimentares e de educação dos cidadãos e cidadãs.
Uma diferença bem bacana deste plano é ter como um de seus pilares a questão de gênero, trazendo a interseccionalidade para a discussão. Entendemos que nem todas as pessoas são impactadas da mesma maneira, e que sua capacidade de resiliência difere. Não estamos somente olhando para as desigualdades como vulnerabilidades, mas também para suas características potencias. Reconhecemos, por exemplo, o papel das mulheres agricultoras e a importância da manutenção de seus saberes ao longo das gerações. É importante olharmos para as diferenças, reconhecê-las e buscarmos corrigir as desigualdades, e é nesse sentido que estamos construindo o Plano.
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Fonte: Boletim de Gases de Efeito Estufa em Piracicaba. Imaflora. |
Quem são os participantes e como foram realizadas as conversas?
Nara: Através de parcerias, o projeto já desenvolveu três importantes estudos, que foram sendo lançados de maneira estratégica de acordo com a dinâmica política das eleições, e que também se constituem como elementos de diagnóstico do Plano. São eles: análise de emissões dos gases de efeito estufa; análise legislativa e de planejamento urbano e análise de risco socioclimático.
Para garantir que a participação contemplasse a diversidade de olhares e experiências de vida da população, foi definida uma estratégia que conta com quatro tipos diferentes de formatos participativos:
● Diálogos participativos, que visam a escuta e amplificação das vozes de grupos marginalizados, como as mulheres, população LGBT, periférica e negra, pequenos produtores e juventudes.
○ Em números: 11 encontros com mais de 100 pessoas (em andamento).
● Grupos de trabalho perenes de adaptação e mitigação, com profissionais e organizações de todos os setores que trabalham com a temática ambiental ou de gênero.
○ Em números: 7 encontros com 63 pessoas (32 mulheres, 21 homens) de 28 organizações (20 delas de Piracicaba).
● Reuniões temáticas pontuais, com especialistas em temas específicos abordados no Plano para trazer aporte técnico e científico nesses assuntos.
○ Em números: 9 encontros com 50 pessoas (35 mulheres e 17 homens).
● Oficinas e eventos culturais, para ampliar a pauta de maneira diversificada - sarau climático, oficina de justiça climática, webinar sobre gênero e clima.
○ Em números: 3 encontros com mais de 300 participantes.
Todas essas trocas se constituíram como um rico subsídio para definir o conteúdo do plano, incluindo mais de 100 diretrizes e mais de 200 ações específicas propostas em um conjunto de 15 temáticas, tais como agropecuária, recursos naturais, mobilidade urbana e acolhimento e empoderamento da população vulnerável.
Quais são os principais eixos, gargalos quanto a emissão de gases?
Nara: De acordo com os últimos dados disponíveis do Sistema de Estimativa de Gases do Efeito Estufa (SEEG Brasil), iniciativa Observatório do Clima, Piracicaba ocupou a 11ª posição de emissão dentre os 645 municípios do Estado de São Paulo em 2018, lançando na atmosfera 1,35 milhão de gás carbônico equivalente.
Nosso boletim mostra que, em Piracicaba, o setor que responde pelo maior número de emissões é o de Energia – queima de combustíveis - com 66% do total emitido. Olhando para os dados, vemos que a gasolina automotiva, utilizada para transporte, tem uma participação significativa. Portanto, neste setor em específico, acreditamos que ações no sentido da mobilidade urbana sustentável têm grande potencial de reduzir as emissões.
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Fonte: Boletim de Gases de Efeito Estufa em Piracicaba. Imaflora. |
Como o NewFor é um projeto sobre restauração florestal, qual a principal mudança que você enxerga que o Plano propõe neste tema?
Nara: Nós ainda estamos escrevendo o Plano, não tem algo totalmente definido sobre o tema de mudanças de uso do solo, mas pelo que os dados de emissão apontam é um setor muito sensível, principalmente quando comparado com outros municípios do estado de São Paulo. Nós com certeza teremos atenção com esse tema.
Entendemos o papel da academia como essencial nessa construção, inclusive a participação do NewFor é muito importante, algumas abordagens dentro do plano foram alteradas posteriores por sugestões da equipe de vocês.
Confira aqui o Boletim de Gases de Efeito Estufa em Piracicaba do Imaflora.
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