Corredores de vida no Pontal do Paranapanema

Por Laury Cullen Junior e Ricardo Gomes César

O IPÊ - Instituto de Pesquisas Ecológicas atua há 29 anos na pesquisa, geração de renda, educação ambiental e conservação e restauração de ecossistemas nativos em diversas regiões do Brasil. Esta longa trajetória conta com a colaboração de comunidades locais, pesquisadores, profissionais da área de conservação, empresas e parceiros nacionais e internacionais. Hoje o IPÊ é uma das maiores ONGs ambientais do Brasil, tendo recebido diversos prêmios e fundos internacionais pela sua contribuição para a biodiversidade. Mas toda essa história começou no extremo oeste do estado de São Paulo, no Pontal do Paranapanema.

Espécies endêmicas vulneráveis ou ameaçadas de extinção, como o mico-leão-preto (Leontopithecus chrysopygus), grandes mamíferos, como a onça pintada (Panthera onca) e anta-brasileira (Tapirus terrestris), grandes fazendas, assentamentos rurais, o maior rio que passa pelo estado de São Paulo (Rio Paraná), o maior remanescente florestal de Mata Atlântica do interior   (Parque Estadual Morro do Diabo)... Tudo isso pode ser encontrado no Pontal do Paranapanema. A região originalmente continha uma reserva florestal de mais de 240 mil hectares, que foi gradualmente desmatada a partir dos anos 60 para agropecuária. Hoje restam somente 18% da cobertura florestal original, e boa parte está no Parque Estadual Morro do Diabo. Além disso, o histórico de caça e retirada dea madeira reduziu as populações de diversas espécies e degradou as florestas remanescentes.
 
Figura 1: Mico-leão-preto. Espécie endêmica do Pontal do Paranapanema ameaçada de extinção. Fonte: Luis Palacios/Arquivos IPÊ.

Ao longo dos quase 30 anos de atuação na região, o IPÊ vem alterando o contexto ambiental e socioeconômico da região. Mais de 1.800 hectares de floresta estão em processo de restauração, sistemas agroflorestais foram implantados em assentamentos rurais e nove viveiros comunitários gerenciados pelas comunidades locais foram estabelecidos pelo projeto. Todas essas ações fazem parte de um plano, que também é um sonho a ser alcançado. O Mapa dos Sonhos, nome como o plano de restauração é conhecido, engloba todo o Pontal do Paranapanema e considera as demandas de restauração de cada propriedade rural para conectar os remanescentes florestais da região, permitindo o movimento da fauna por toda a paisagem enquanto melhora as práticas agrícolas e gera renda para os moradores do Pontal.
 
Figura 2: esquema gráfico do mapa dos sonhos do Pontal do Paranapanema, indicando os diferentes usos da terra na região. Fonte: IPÊ.

Mantendo sua fundação pautada na ciência para a conservação, restauração e monitoramento dos projetos, a parceria com o NewFor fluiu naturalmente para o IPÊ. A atuação conjunta dos pesquisadores de ambas as iniciativas permite unir a experiência local do IPÊ com as diversas expertises acadêmicas e metodológicas. Os dados de estrutura e diversidade da vegetação dos diferentes contextos florestais coletados pelo NewFor irão contribuir para direcionar ações de conservação e manejo na região. De forma semelhante, os dados remotos (LiDAR) de vegetação obtidos este ano estarão relacionados com dados obtidos no passado pelo IPÊ, permitindo o mapeamento detalhado de um corredor ecológico crucial para conectar o Morro do Diabo às reservas contendo o ameaçado mico-leão-preto. Pesquisadores de ambas as instituições também seguem monitorando os benefícios econômicos dos sistemas agroflorestais e da cadeia de produção de restauração, a fim de continuamente aprimorar os benefícios sociais da restauração. Desta forma, a ciência desenvolvida pelo NewFor e pelo IPÊ pode ser aplicada conjuntamente para direcionar ações na região.
 
Figura 3: entrevista com assentado rural que foi capacitado para implementação de sistemas agroflorestais.

Nestes quase 30 anos de ação no Pontal, o IPÊ compartilha as seguintes lições para ações efetivas de restauração de paisagens florestais:

- A presença institucional e envolvimento das comunidades locais no planejamento, implementação, monitoramento e avaliação do projeto gera confiança e engajamento em longo prazo.

- Promover ações que gerem benefícios socioeconômicos para as comunidades locais é um componente importante do processo de restauração das paisagens florestais.

- O planejamento das ações em escala de paisagem permite que ações locais gerem benefícios mais amplos.

- É necessário tempo, experiência e esforço para manejar uma paisagem. É necessário experimentar, conversar muito e facilitar o processo entre os grupos envolvidos.


Laury Cullen Junior possui graduação em Engenharia Florestal pela Universidade de São Paulo, mestrado em Biologia da Conservação pela Universidade da Florida (USA), doutorado pela Universidade de Kent na Inglaterra, Pós-Doutorado pela Universidade de Columbia, USA e pela Universidade da Florida, Gainesville, USA. Professor associado junto ao ESCAS - Escola Superior de Conservação e Sustentabilidade, pesquisador associado do Instituto de Pesquisas Ecológicas. É fellow da fundação ASHOKA de empreendedores sociais. Tem experiência na área de ecologia, com ênfase em restauração de paisagens fragmentadas,atuando principalmente nos seguintes temas: biologia da conservação, conservação de espécies ameaçadas, restauração de paisagens, envolvimento de comunidades locais, agrofloresta e serviços ecossistêmicos. Tem dois livros publicados e mais de 50 artigos em periódicos nacionais e internacionais. Entre os prêmios recebidos estão o Whitley Gold Award recebidos das mãos da Princesa Anne na Inglaterra em 2002 e o Rolex Conservation Award em 2005 e o Fiona Alexander Prize em 2007, oferecido ao melhor estudante de seu ano na Universidade de Kent na Inglaterra. Em 2017 recebeu o prêmio nacional em Excelência em Restauração oferecido pela SER (Society for Restoration Ecology). Entre seus hobbies preferidos estão a família, a vela, corridas e o futebol.

Ricardo Gomes César é bacharel em Engenharia Florestal pela ESALQ-USP, doutor em Conservação de Ecossistemas e especialista nas áreas de Ecologia da Restauração pela ESALQ/USP. Trabalha com os temas de Restauração Ecológica, Ecologia da Paisagem, Comunicação Científica, Seleção de Modelos, Sucessão Florestal e Restauração de Paisagens Florestais. Possui experiência em ministrar disciplinas no ensino superior e é co-autor de artigos científicos publicados na revista Nature e Science Advances, entre outras revistas internacionais. Já trabalhou como colaborador nas ONGs SOS Mata Atlântica, The Nature Conservancy (TNC) e WeForest. Atualmente é estudante de pós-doutorado no Laboratório de Silvicultura e Restauração Florestal na ESALQ/USP em parceria com o IPÊ. Fluente em Inglês, Espanhol e Português, tendo traduzido artigos e livros para inglês e português.


Leitura recomendada

1. Chazdon RL, Cullen L, Padua SM, Padua CV (2020) People, primates and predators in the Pontal: From endangered species conservation to forest and landscape restoration in Brazil’s Atlantic Forest. Royal Society Open Science 7. Disponível em: https://royalsocietypublishing.org/doi/10.1098/rsos.200939

2. Relatório anual de atividades do IPE: https://www.ipe.org.br/ra2019/


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